Categoria: Dor Neonatal

Toxicidade da metadona e possível indução e aumento da eliminação no neonato prematuro

Toxicidade da metadona e possível indução e aumento da eliminação no neonato prematuro

Methadone toxicity and possible induction and enhanced elimination in a premature neonate.

George M, Kitzmiller JP, Ewald MB, O’Donell KA, Becter ML, Salhanick S.J Med Toxicol. 2012 Dec;8(4):432-5. doi: 10.1007/s13181-012-0249-8.PMID: 22898875 Free PMC Article Similar articles. Artigo Integral!

Apresentação:Allana Nogueira e Rafaella Brunale. Coordenação: Paulo R. Margotto

Os dados toxicológicos e a recuperação clínica apresentados neste relato de caso (quando o recém-nascido recebeu em uma única dose de metadona para desmame do fentanil,  o equivalente a 200 vezes a dose pretendida por um erro de diluição),  levam à luz a indução do metabolismo como uma ferramenta de gerenciamento potencial para a superdosagem  de metadona no recém-nascido (RN).Duas horas após a superdosagem de metadona, o RN apresentou sinais de depressão respiratória, necessitando de ajuste para o ventilador. Devido a movimentos interpretados como convulsões presumíveis, foi iniciado o fenobarbital, com melhora do estado ventilatório e hemodinâmico. A toxicidade pela metadona resulta em depressão respiratória, depressão do estado mental, convulsão, hipotensão, hiperglicemia, rigidez torácica e arritmias que podem ser fatais (prolongamento do intervalo QT). A meia-vida da metadona é longa, variando entre 3,5 até 60 horas nos pacientes pediátricos (no RN deste caso foi de 30 horas).Nos RN a absorção intramuscular é atrasada (instabilidade vasomotora periférica), a percutânea é aumentada (diminuição da espessura do estrato córneo, aumento da área superficial por peso). N-desmetilação significativa ocorreu neste neonato, provavelmente às custas de CYP3a  induzida pelo fenobarbital. A indução enzimática pode ser considerada uma ferramenta complementar potencial para o gerenciamento de superdosagem de metadona. A despeito de uma recente ocorrência de intoxicação por metadona na nossa Unidade, nos links discutimos também o papel do uso do naloxone ou naloxona endovenosa (antagonista potente e competitivo do receptor μ-opióide, deslocando os opióides dos receptores cerebrais e restaura a respiração e a consciência, levando 2-5 minutos para o efeito). Há poucas informações neonatais na literatura. Pode ser administrado, off label, por vias subcutânea, endotraqueal, sublingual, inalada e intranasal (importante este conhecimento principalmente em cenários sem acesso venoso, que é a forma preferencial). Em situações de intoxicação com a metadona em pacientes em uso dessa, há uma menor taxa de abstinência se uso do naloxone de forma contínua , iniciando com menor dose (estudos em adultos!). Entre efeitos colaterais tóxicos do naloxone incluem arritmias cardíacas, hipertensão e edema pulmonar não cardiogênico. Em situação de superdosagem de Metadona, em paciente recebendo metadona e  estando atento à Síndrome de rigidez torácica que pode ocorrer com a metadona, temos a seguinte conduta: suporte ventilatório; naloxone:0,1 mg/kg (0,25-0,5ml/kg da concentração de  0,4mg/ml), repetindo de acôrdo com a resposta a cada 3-5 minutos, devendo ser mantida alguma terapia com o opióide para evitar síndrome de abstinência. Fenobarbital, inicialmente se convulsão e posteriormente, se muito necessário for, para acelerar a depuração do opióide. Consultado o Dr. Charles Berne (Professor of Anaesthesia (Pediatrics),Harvard Medical School) que nos informou: a metadona tem um metabolismo mais lento em recém-nascidos em comparação com bebês e crianças mais velhas, então você esperaria um período muito longo de narcotização parcial. Mesmo quando os bebês parecem relativamente acordados e respirando mais que o  ventilador, eles terão concentrações residuais de metadona por um longo tempo, portanto, eles exigem uma observação prolongada mesmo após a extubação e correm risco adicional de hipoventilação e apneia durante vários dias após a extubação.Eu não tenho uma opinião forte sobre fenobarbital neste cenário. Pode acelerar a depuração da metadona ao longo do tempo por indução da enzima hepática, mas pode ter uma interação direta mais imediata com a metadona para intensificar a depressão respiratória

Dor Neonatal – 2019

Dor Neonatal – 2019

Autores: Paulo R. Margotto, Ludmylla Beleza

Capítulo do Livro Assistência ao Recém-Nascido de Risco, Hospital de Ensino Materno Inantil de Brasília, 4a Edição, 2018 (em preparação)

Nos últimos 5-10 anos descobrimos que os recém-nascidos (RN) prematuros são mais susceptíveis à dor que os RN a termo. Os prematuros têm limiares mais baixos para o reflexo de retirada do membro (reflexo flexor vaso-cutâneo) que tem uma porção aferente medida pelas fibras C, fibras que mediam estímulos neurológicos. Também há uma maturação retardada das fibras inibitórias descendentes (a porção excitatória deste sistema se desenvolve cedo, não havendo inibição descendente que se desenvolve mais tarde). Há 3 estudos evidenciando que os bebês têm um limiar mais alta de dor nas extremidades superiores em comparação com as extremidades inferiores, porque as fibras inibitórias descendentes alcançaram a porção cervical da coluna dorsal e ainda tem que crescer para a porção lombar. Assim, existem diferentes níveis de dor (muito mais dor será produzida nas extremidades inferiores que nos braços e mãos).

Uma das causas freqüentemente colocada para justificar que o RN (prematuro e a termo) não tem percepção da dor é a falta de mielinização. É importante lembrar que mesmo no adulto, 75% dos impulsos noceptivos são carreados através de fibras periféricas não mielinizadas. Dados neuroanatômicos recentes mostram que a mielinização está presente nas vias tálamo-corticais a partir da 22a – 23a semana de idade gestacional, estando completamente mielinizado na 37a semana de gestação (com 30 semanas, as vias noceptivas até o tálamo já estão completamente mielinizadas) e já tem conexão tanto com o sistema límbico como com o sistema cortical.Assim, o RN, incluindo o RN pré-termo extremo  possui substrato neurológico para a nocicepção, ou seja, o RN está apto a integrar e responder ao estímulo doloroso.

Por quê colhemos sangue na mãozinha ao invés do calcanhar? Nos últimos 5-10 anos descobriu-se que os RN prematuros são mais susceptíveis à dor que os RN a termo. Os prematuros têm limiares mais baixos para o reflexo de retirada do membro (reflexo flexor vaso-cutâneo), que tem uma porção aferente medida pelas fibras C, sendo estas responsáveis por mediar os estímulos neurológicos. Também possuem uma maturação retardada das fibras inibitórias descendentes (a porção excitatória deste sistema desenvolve-se cedo, não havendo inibição descendente, que se desenvolve mais tarde). Há 3 estudos evidenciando que os bebês têm um limiar mais alto de dor nas extremidades superiores em comparação com as extremidades inferiores, já que as fibras inibitórias descendentes alcançaram apenas a porção cervical da coluna dorsal, tendo ainda que crescer para a porção lombar. Dessa forma, existem diferentes níveis de dor de acordo com a porção do corpo em que é aplicada (muito mais dor será produzida nas extremidades inferiores que nos braços e mãos).  A venopunção no dorso das mãos é muito menos dolorosa do que  a coleta no calcanhar, além de que a primeira é um procedimento rápido e se obtém  mais freqüentemente sucesso com apenas uma punção.

Síndrome de abstinência neonatal – 2021

Síndrome de abstinência neonatal – 2021

Autores:  Paulo R. Margotto, Sergio Henrique Veiga

Capítulo do Livro Assistência ao Recém-Nascido de Risco, Hospital de Ensino Materno Infantil de Brasília, 4a Edição, 2021

Os efeitos das drogas sobre o feto estão na dependência de vários fatores, entre os quais, o tipo de droga, a quantidade, a frequência do uso e o período gestacional em que ocorreu o uso. Entre estas substâncias, se destacam a cocaína e o crack (subproduto da cocaína). Quando misturada com bicarbonato de sódio ou amônia, forma pedras de cocaína, que recebem o nome de crack (do verbo to crack, que significa quebrar, devido aos pequenos estalidos produzidos pelos cristais ao serem queimados, como estivem sendo quebrados). Assim, a cocaína pode ser consumida através do fumo (cachimbo, cigarro). A cocaína, considerada estimulante do sistema nervoso central, age inibindo a:    –recaptação da norepinefrina (daí seus efeitos: vasoconstrição, hipertensão arterial, taquicardia)

da dopamina (daí seus efeitos: sensação de euforia, aumento do estado de alerta, redução da fadiga, estimulação sexual; a depleção dos estoques de dopamina pelo uso continuado da droga leva o usuário a um estado depressivo, sintomas de abstinência).

-da serotonina nos terminais nervosos pré-sinápticos, ocorrendo uma estimulação prolongada destes receptores na membrana pós-sináptica.

A cocaína passa rapidamente através da placenta por difusão simples. Os efeitos da cocaína no feto podem estar aumentados, devido às modificações do metabolismo da cocaína durante a gestação (há uma redução da atividade da colinesterase plasmática, com diminuição do metabolismo da cocaína).

Analgesia e sedação no recém-nascido em ventilação mecânica/sequência rápida de intubação

Analgesia e sedação no recém-nascido em ventilação mecânica/sequência rápida de intubação

Capítulo de autoria dos Drs. Paulo R. Margotto/ Marta David Rocha Moura,  da 4a Edição do livro Assistência ao Recém-Nascido de Risco, Hospital de Ensino Materno Infantil de Brasília SES/DF, 2019 (em preparação)

O cuidado intensivo é uma experiência dolorosa para o recém-nascido com importantes repercussões no futuro (nos prematuros o limiar da dor diminui após repetido estímulo sensorial e mesmo estímulo não doloroso pode ser percebido como estresse). Embora os médicos estimem que muitos procedimentos na UTI Neonatal são dolorosos, acima de 65% dos pacientes do estudo de Simons e cl não receberam terapia analgésica apropriada. O número de procedimentos é significativamente maior nos RN que requerem suporte ventilatório, principalmente no primeiro dia de internação, devido à estabilização inicial, monitorização e a avaliação diagnóstica. Assim, para estes RN considerar a infusão endovenosa de opióide.

Aranda chama atenção para o uso de morfina em neonatos pré-termos ventilados (o seu grupo passou a usar o fentanil, mas existe aquela preocupação, pois o fentanil é um opiáceo e poderia produzir os mesmos efeitos da morfina).

A despeito dos efeitos adversos, os opióides são usados em muitas UTIs Neonatais e  os benefícios da analgesia quando usada cuidadosamente podem suplantar os riscos destas drogas.

O grupo do Aranda está examinando o papel do ibuprofeno endovenoso: este tem 50% de efeito que poupa o opiáceo. São bons para o tratamento da dor. Possivelmente teremos no futuro drogas não opióides no controle da dor. Isto ainda deverá ser estudado.

A evidência presente sobre o uso de analgesia nos RN ventilados de forma rotineira não mostra claros benefícios em termos de melhora do prognóstico neurológico a curto prazo dos RN pré-termos ventilados e benefícios marginais nos RN a termo ventilados. Dor prolongada e estresse são difíceis de medir nos RN prematuros criticamente doentes, particularmente nos RN extremamente prematuros. Assim é difícil estabelecer a eficácia clínica da analgesia e sedação prolongada nestes RN.

Os efeitos a longo prazo da exposição a dor/estresse repetitivo ou a drogas analgésicas e sedativas nos primeiros dias de vida continua inexplorado. Mais pesquisas em diversas populações de RN prematuros e RN a termo ventilados são necessárias antes de se colocar a analgesia e a sedação no RN em uma base científica.

Segundo Linda Frank, comentando o estudo de Jacqz-Aigrain e cl, preocupação teórica a respeito da provisão de agentes amnésticos durante o período crítico do desenvolvimento do cérebro deve também ser bem pensado antes do uso generalizado de infusão prolongada de midazolam. Até que possamos definir medidas apropriadas da eficácia de sedativo e toxicidade a curto e longo prazo para esta população, o uso de infusão contínua de midazolam nos neonatos parece prematuro.

Até que seja determinada a relação risco/benefício por futuros estudos e uma vez que a administração de benzodiazepínicos frequentemente foi associada com efeitos adversos, o seu uso na vulnerável população de recém-nascidos deve ser realizado com critérios rigorosos.

Segundo Perlman é essencial que o potencial para a dor associado com medicação faça parte de qualquer estratégia de manuseio neonatal. No entanto, qualquer intervenção para minimizar a dor, deve incluir agentes que alcancem os objetivos desejados, enquanto ao mesmo tempo minimize os efeitos potenciais adversos.

Segundo Kennedy e Tyson, o mais efetivo meio de reduzir a dor e o sofrimento dos RN pré-termos na UTI Neonatal seria encontrar o melhor método de prevenir a hemorragia intracraniana, a doença pulmonar crônica, a enterocolite necrosante e outras causas de morbidade de longo prazo.

A intubação endotraqueal no recém-nascido é dolorosa e está associada com efeitos fisiológicos adversos. Muitos bebês podem ser intubados com boa analgesia e com somente breve e leve hipoxia e sem bradicardia.

 

Implicações da dor e da exposição à morfina no neurodesenvolvimento

Implicações da dor e da exposição à morfina no neurodesenvolvimento

De Kesavan K et al, 2015, Apresentado pela Dr. Letícia Rodrigues de Moraes, R3 em Neonatologia do HMIB/SES/DF, sob Coordenação da Dra. Evely Mirela. Os opiáceos como morfina e fentanil atuam nos receptores mu, kappa e delta e ativam várias vias intracelulares de sinalização que são responsáveis não só pelos efeitos analgésicos mas também pela modulação na proliferação, sobrevivência e diferenciação de células tronco, neurônios, a células da glia que expressam receptores opióides. A exposição repetida à morfina, tanto longa (>7 dias) como curta modifica a neuroplasticidade sináptica nos locais pós-sinápticos do sistema límbico, o que leva a um permanente efeito de reorganização das conexões sinápticas nas áreas que regulam motivação, recompensa e aprendizagem ao longo da vida adulta. Essas mudanças são permanentes e permanecem mesmo após a remoção da morfina. A maior exposição à morfina foi associada a maiores características de internalização como padrão ansioso/depressivo e triste/depressivo ou problemas somáticos. A exposição neonatal a opióides pode ter implicações duradouras para a estrutura e função do cérebro, PRINCIPALMENTE NA AUSÊNCIA DE DOR. Tal como acontece com toda decisão clínica, os riscos e benefícios da analgesia com opióides deve ser considerado com cautela. Quano ao fentanil: causa menos hipotensão, menos efeito sedativo, pode causar menor desenvolvimento cerebelar. São necessários estudos posteriores prospectivos, que avaliem os riscos e benefícios do uso de sedativos e analgésicos mais comuns, particularmente em relação ao crescimento cerebral.Torna-se importante que saibamos avaliar as consequências clínicas de tudo que fazemos na UTI Neonatal, pois tratamos de cérebros, principalmente relacionadas coma precoce administração de opióides nestes vulneráveis pré-termos. Há sugestão da necessidade de um novo projeto de agentes que podem alterar as mudanças neuroplásticas induzidas pelos opiáceos. NA UTI NEONATAL TODOS OS CAMINHOS CONDUZEM AO CÉREBRO! particularmente em relação ao crescimento cerebral.Torna-se importante que saibamos avaliar as consequências clínicas de tudo que fazemos na UTI Neonatal, pois tratamos de cérebros, principalmente relacionadas coma precoce administração de opióides nestes vulneráveis pré-termos. Há sugestão da necessidade de um novo projeto de agentes que podem alterar as mudanças neuroplásticas induzidas pelos opiáceos