Canal arterial patente: da fisiologia ao tratamento
Martin Kluckow (Austrália).IX Congresso Iberoamericano de Neonatologia-SIBEN, 20 a 23 de junho de 2012, Belo Horizonte, MG. Realizado por Paulo R. Margotto
A literatura nos tem recheado de informações (controversas) a respeito da melhor conduta na persistência do canal arterial (PCA), a começar pela definição do que é uma PCA hemodinamicamente significativa (PCAhs). A combinação de dados clínicos (dificuldade de desmame de suporte ventilatório, hipotensão arterial refratária, sinais de insuficiência respiratória) e com os dados ecocardiográficos fluxo reverso na aorta descendente ao nível do diafragma e padrão de shunt pulsátil, medidas do volume ventricular esquerdo e da pressão de enchimento, diâmetro do canal arterial – um diâmetro acima de 2,2mm no terceiro dia de vida, associado a sinais clínicos prediz ausência de fechamento espontâneo, segundo estudo de Afiune et al ([Echocardiographic post-neonatal progress of preterm neonates with patent ductus arteriosus]. Afiune JY, Singer JM, Leone CR. J Pediatr (Rio J). 2005 Nov-Dec;81(6):454-60. Portuguese.Artigo Integral) tem sido usado em 66% dos ensaios clínicos avaliados para esta definição. Estamos na fase do desenho de estudo prospectivo envolvendo recém-nascidos abaixo de 30 semanas de idade gestacional que apresentam escape diastólico cerebral detectado na ultrassonografia transfontanela Doppler, com o objetivo de detectar se há associação entre dados clínicos e ecocardiográficos de PCAhs com este achado. Outros autores utilizam somente sinais clínicos, como a presença de hemorragia pulmonar (secreção sanguinolenta persistente no tubo endotraqueal) isoladamente ou sinais de PCA com cardiomegalia e edema pulmonar evidenciado ao Rx de tórax com um dos seguintes: hipotensão necessitando de vasopressor numa dose acima de 10ug/kg/min ou insuficiência respiratória não identificada por outra causa que não a PCA, com parâmetros elevados no respirador).
Na avaliação do tratamento levar em consideração a idade gestacional (75% das PCA na idade gestacional >29 semanas fecham espontaneamente). Na avaliação do tratamento profilático, levar em consideração, no seu Serviço, a presença de cardiologista, as incidências de hemorragia intraventricular severa e hemorragia pulmonar (em estudo recentemente publicado, a incidência destas duas morbidades foi, respectivamente de 32,2% e 20% (grupo de 25 semanas-27sem6dias), 20,9% e 11,1% (28 semanas a 29sem6dias) e 7,3% e 1,3% (30semanas a 31sem6dias). A PCA ocorreu em 44%,20% e 19,8%, respectivamente em cada grupo de idade gestacional (Survival and morbidity of premature babies with less than 32 weeks of gestation in the central region of Brazil]. de Castro MP, Rugolo LM, Margotto PR. Rev Bras Ginecol Obstet. 2012 May;34(5):235-42. Português). Artigo Integral. Como se refere o Dr. Martin Kluckow, seria simplicista demais dizer para tratar todos ou não tratar ninguém. Aceitar a hipótese nula implica que não seja necessário o fechamento de todas as PCA, principalmente em RN > 1000g, além da falta de benefício do fechamento profilático, à luz das evidências. A medicina tornar-se uma arte quando a exercemos combinando a evidência com a experiência; não podemos deixar nossas práticas serem tiranizadas somente com a evidência, pois muitas vezes a “ausência de evidência não é a evidência da ausência”. Nos RN com PCA hemodinamicamente significativa (sinais clínico = ecocardiográficos), principalmente nos RN <1000g nos primeiros dias de vida em suporte ventilatório a opção pelo seu fechamento farmacológico (e não cirúrgico!) pode resultar em diminuição de repercussões adversas. A opção pelo ibuprofeno oral advém da dificuldade de se obter ibuprofeno venoso no nosso meio, associado com evidências de melhor benefício do oral sobre o venoso, inclusive em recém-nascidos pré-termos extremos, além de não expor estes RN ao risco de hipertensão pulmonar ocasionada pelo ibuprofeno venoso, inclusive o ibuprofeno lisina. Também não dispomos de indometacina endovenosa. Devemos lembrar sempre: Na UTI, identificar subgrupos de neonatos com maior risco para resultados adversos (e nestes, somente nestes atuar!). Esta é a orientação que temos seguido na abordagem da persistência do canal arterial no nosso Serviço.